Fabio Giambiagi analisa desafios e rumos da economia brasileira

Fabio Giambiagi elenca, em entrevista ao Sistema Findes, os motivos que o fazem favorável às mudanças no sistema de aposentadorias. Ele é economista de grande renome, mestre em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente é economista-chefe do BNDES. Com vários artigos publicados internacionalmente, tem uma trajetória ao longo dos anos em instituições como BID, IPEA, Ministério de Planejamento e Orçamento, PUC, UFRJ, dentre outras.

Qual é a atual situação da economia brasileira?

É uma situação marcada por muita incerteza e por um aspecto ambíguo. Há uma série de elementos favoráveis a um processo de retomada do crescimento: estamos com a inflação controlada, contas externas tranquilas e sem necessidades de grandes ajustes tarifários, temos um nível de desemprego que é um problema sério e dramático, mas que permite um horizonte de expansão durante alguns anos da economia, sem o menor risco de que haja pressão inflacionarias derivadas de aumentos salariais.

Então, num ambiente político mais estável e com mais propostas de governos adequadas, nós teríamos diversos elementos do quebra cabeça compostos para favorecer um processo de retomada do crescimento, por outro lado, nós temos um grau de fragmentação e polarização política perigosa e que dificulta muito o tratamento legislativo das propostas no congresso. Uma situação muito delicada por que se o próximo governo não der continuidade a agenda de reformas do atual, iremos a uma situação fiscal muito perigosa, considerando que já estamos com um nível de déficit público de 7% ou 8% do PIB.

O aspecto mais crítico da crise já passou?

Passou mais pode voltar. No sentido de que o clímax da crise se deu no primeiro semestre de 2016, no pico da incerteza política, quando não se sabia o que aconteceria com o país. Havia um embate institucional muito sério entre o presidente da câmara de deputados na época, Eduardo cunha e, a então presidente Dilma Roussef. Depois, com a posse do presidente Michel Temer, recolocamos a economia nos trilhos e de fato a economia no final do ano passado e começo deste ano, retomamos um crescimento.

A inflação tinha caído e estamos assistindo a níveis de taxas de juros como nunca víamos desde a desestabilização. Agora, caiu a ficha do mercado com a alta do dólar nas últimas semanas, de que a situação para o ano que vem está com muitas incertezas e há possibilidades sérias de que sejam adotadas políticas equivocadas, ou que se tentem adotar políticas certas, mas não haja espaço no congresso e, nesse caso, a crise de 2016 pode voltar.

Quais as perspectivas para o futuro?

Perspectivas embaçadas. Eu estou no negócio de tentar perspectivar o futuro desde o final dos anos 80. Já vi de tudo na época de hiperinflação, grandes recessões, grandes surtos de crescimento, mas realmente, me lembro poucas vezes de uma situação com cenários possíveis futuros tão dispares.

Antes, em situações ruins a gente podia vislumbrar um crescimento futuro de 1,5% de 2,5%, quando as coisas estavam bem, vislumbrávamos um crescimento de 3,5% de 4%, mas nas circunstâncias atuais, é possível uma história de sucesso para o Governo com novas medidas de ajuste, a famosa reforma da previdência, criando-se um ambiente pra deslanchar a economia em torno 3% em torno de alguns anos, o que seria muito bom para a recuperação dos empregos e redução do desemprego, ou uma história muito ruim, em que todos os fantasmas voltem a sair do armário, o fantasma da inflação elevada, o fantasma do risco de calote da dívida pública e etc.

Quais os caminhos para a retomada econômica?

No meu modo de ver, não há outro caminho que não passe por uma combinação de três coisas: controle de gastos públicos, associado a uma reforma da previdência que leve os parâmetros de concessão de benefícios a se adequarem à realidade demográfica do pais e, o mais importante de tudo, um ambiente de dialogo político para que o congresso assuma as responsabilidades que lhe cabem.

A ideia de que os problemas são do governo, uma instituição, passa por cima do fato de que vivemos todos no mesmo espaço. Se as políticas fracassarem – porque a política entendida como exercício e entendimento entre grupos diferentes, fracassou – sofreremos todos.

Quando o cidadão anda e observa uma bala perdida, quando vai ao atendimento no hospital e encontra cenários deploráveis, que todas as noites vemos nos noticiários de televisão e, quando aparece notícias sobre o baixo nível dos nossos alunos nas provas internacionais, quem sofre não é apenas a popularidade do Governo e sim, a população com um todo.

Autor há onze anos do livro “Reforma da Previdência”, você defende a abrangência do texto da reforma e acredita que é crucial para a sustentabilidade do teto de gastos e das contas públicas. Explique melhor sobre esse ponto de vista.

A despesa do INSS está a caminho de ser R$ 600 bilhões e embora as questões de fraudes estejam recorrentemente no noticiário, ao contrário do que a maioria das pessoas supõe, o grande problema da despesa previdenciária não é apenas as irregularidades que existem e obviamente devem ser combatidas e, sim um conjunto de regras que faz com que as pessoas no Brasil se aposentem em idades que comparativamente ao resto do mundo, são simplesmente desproporcionais.

Do ponto de vista individual quem não ficaria feliz tendo a possibilidade de se aposentar aos 45 anos, como acontecem atualmente em muitos casos. Do ponto de vista coletivo, isso é uma manifestação, digamos assim, de egoísmo coletivo. Isso está se tornando uma constante em todos os âmbitos e, cada um passa a olhar única e exclusivamente em função do seu próprio interesse.

Eu participo de muitos encontros internacionais e todas as vezes que esse tipo de caso vem à tona e não são poucos, isso causa uma total perplexidade ao estrangeiro. Temos que modificar esse conjunto de regras, atacando os casos mais extremos, o que significa estabelecer uma barreira para as aposentadorias precoces, através da instituição de uma idade mínima razoável.

A reforma proposta resolve os problemas do país com a Previdência?

A reforma que foi desenhada, do meu ponto de vista, é uma reforma boa para o médio e o longo prazo. Entretanto, é uma proposta bastante tímida para o curto, porque ela faz com as pessoas trabalhem 50% a mais do que o tempo restante que lhe faltaria com a regra original.

Significa que se uma pessoa tivesse a necessidade de trabalhar mais seis meses para se aposentar em condições muito favoráveis ela, a partir da aprovação da reforma, ela teria que trabalhar não seis, mais nove meses, mas continuaria se aposentando numa idade precoce.

O tratamento mais adequado deveria ser a adoção de uma idade mínima. Além disso, no meu ponto de vista, o governo que assumir deveria considerar aquela reforma proposta originalmente em 2016 e pensar alguns elementos de reforço do ajuste, considerando que a gente passe a conviver com um quadro macroeconômico muito ruim.

O que é central na discussão sobre a reforma no Brasil?

O ponto é passar a entender a questão como algo que deve ser objeto de uma abordagem de estado e, não uma abordagem de governo. O que eu quero dizer com isso: se encaram certas questões como uma questão de governo, então quem está no governo tende a votar a favor e quem está na oposição tende a votar contra. Como no Brasil os partidos do governo no geral só têm 15% ou 18% da câmara, eles não têm força por si só para aprovar uma reforma desse tipo. Mas, a oposição precisa entender que quem está na oposição hoje, poderá ser governo amanhã e, que se nós, como país, não dermos um jeito nisso, o pais fica inviável. É um quadro muito sério e que requer um tratamento a altura da responsabilidade e do desafio que o país enfrenta.

Entrevista por Cinthia Pimentel

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